quinta-feira, 4 de março de 2010

O "Monodrama" de Carlito Azevedo

Depois de treze anos no silêncio, foi com grande prazer que os leitores do poeta carioca Carlito Azevedo receberam em dezembro/09 a publicação de seu mais recente livro, "Monodrama", pela 7Letras.

Com um conjunto amplo de poemas "de tirar o fôlego", Carlito alcança neste trabalho, talvez o mais pessoal de sua trajetória, a marca da poesia de alta qualidade: permite que o leitor ouça o som da voz do poeta. Em várias páginas de "Monodrama" me vi cruzando "leitura com escuta", uma sensação que poucos poetas podem propiciar. O próprio Carlito ao definir a linguagem que compõe sua poesia a situa como "mais próxima do ritmo de minha fala, das pausas de minha respiração".

Um outro valor a ser destacado no livro, entre tanto outros, é a mancha da página. Importante o cuidado do poeta/editor com a distribuição das frases e dos vazios que compõem os poemas, dando-lhe uma dinâmica, um arejamento, um sopro mesmo, que permitem ao leitor como que se colocar frente aos versos.

Apresentando poemas que são sensíveis às questões da cidadania, do imigrante, da contemporaneidade, do drogado, de caminhadas cariocas pelo centro do Rio, do tempo e do espaço, que questiona a percepção da realidade em um mundo encharcado de contradições, de perdas e desencantos, que vão do lirismo ao dramático, que trata da morte (em belíssima construção sobre a morte de sua mãe), acredito que se possa dizer, porém, que o amor é o grande personagem do livro. É o próprio Carlito que afirma em uma entrevista: "O amor é a única coisa que importa no fim das contas... O amor gerou Clarice Lispector. O amor gerou Chagall. O amor gerou Spinoza e Oscar Niemeyer. Quer se trate do amor à verdade, do amor pelo saber, ou do amor que se dá entre duas pessoas, quem não se deixou tocar por esse sentimento se tornou um inútil, uma versão diminuída e cretinizada do humano. Que você tenha notado que o amor perpassa todo o livro, abrindo nele pontos luminosos, tornando-o poroso a esse êxtase permanente do viver, me parece melhor do que qualquer elogio. "

Com um sólido trabalho na coordenação de oficinas de poesia onde vem formando um rico naipe de poetas na cidade do Rio de Janeiro, ou como tradutor, ou ainda como editor de revistas de poesias, com "Monodrama" Carlito Azevedo vem firmar-se como uma das vozes mais fortes da poesia que se produz no Brasil na atualidade.

.....
A busca do meu próprio rosto no alfabeto
azul-ozônio que subia, livre, tatuado,
braço acima e céu acima, até a praia de flamingos
de um colo nu, órbita de
miçangas lunares, sublunares.

Não há resposta, camponês, nunca houve
em céu algum, vida alguma, isso de respostas,
só a veemência de uns espelhos

E assim, enquanto avançavam as horas no relógio de Júlio de Abreu
e ficavam para trás todos os sorrisos ("e esquilos brincavam
nesses sorrisos como se sobre ramas", sussurrava
uma voz volátil),
dentro do táxi,
no fundo do coraçào, disparado,
seguia comigo
o rosto de Marília.

Um comentário:

Bruno Villela disse...

Olá Daisy, me chamo Bruno Villela, sou bacharel e licenciado em Filosofia pela USP, estudo cinema na América Latina, (tendo me candidato ao mestrado no PROLAM esse mês) e escrevo poesia também. Maravilhoso o seu projeto. Gostaria de conhecer melhor. Se tudo der certo, creio que estarei publicando meu primeiro livro de poemas até o fim do ano. Acho que meu esforço poético condiz com o trabalho buscado pelo seu projeto. Venho tentando realizar uma poesia que chamo de dub, uma colagem coletiva de vozes, sons, e ritmos dos países do Sul, principalmente os latino-americanos, usando-se da linguagem do rap e dub jamaicano. Uma parte do meu livro se intitula Poemas In SUR gentes. Onde tento abordar poeticamente a urgência do Sul, o hibridismo latinoamericano e a construção de identidades. Gostaria de mandar-lhe um livrinho meu, se quiseres. Me passe seu contato. Se quiser dar uma espiada no meu blog, lá vai!

www.olho-roxo.blogspot.com